Durante muito tempo vivi com o peso na consciência porque viajava em trabalho muitas vezes, para dentro e para fora de Portugal, e deixava o meu filho entregue aos cuidados do pai.
Se por um lado o meu sonho era progredir profissionalmente, e para isso deveria criar e aceitar as oportunidades nesse sentido, a outra parte de mim, a Rute mãe, vivia em sofrimento.
Sentia-me mal, não aproveitava rigorosamente nada nas viagens, era um peso gigante só de pensar que tinha deixado o meu filho com o pai, para eu ir viajar em trabalho.
WTF o que é isto?? Será que sou boa mãe?? Será que não amo o meu filho o suficiente??
Durante as viagens fazia o meu trabalho sob pressão e regressava rapidamente. E se, por acaso, a viagem durasse mais do que o tempo previsto, ficava literalmente na merd%% e entrava em pânico, do tipo:
Como é que vou explicar que não irei chegar no dia previsto?
Há 10 anos, em 2014, tomei a decisão de ficar mais 3 dias numa das viagens que fazia frequentemente à Ásia e tirar 3 dias só para mim. A intenção estava lá e era boa de facto, mas não resultou.
Eu só pensava:
- O que será que os outros vão pensar?
- Vão dizer que deixei o meu filho com o pai para me divertir?
- Quando chegar, o meu filho vai rejeitar-me!
Ninguém nas minhas circunstâncias (segundo a minha ordem de pensamentos negros e uma boa parte deles educacionais) poderia divertir-se. Era ilícito, não tinha esse direito, mãe separada com um filho…
Levei esses 3 dias de telemóvel na mão, num destino paradisíaco… 3 dias dedicados às opiniões alheias e aos pensamentos de merd%% que fui alimentando (valeu bem a pena!!).
Partilho convosco 2 fotos minhas dessa viagem, onde o meu fake estado de felicidade não consegue enganar ninguém.
A sociedade ainda condena muito as mulheres que assumem profissões diferentes do padrão normal. Nos últimos anos senti algumas evoluções positivas nesse sentido, mas acredito que é necessário fazermos mais e falarmos mais sobre este assunto. Também precisamos de mais união entre as MULHERES e que sejamos mais parceiras nesta CURA, que é de todas nós…
A mudança das mentalidades leva o seu tempo; não se trata de esperar, mas sim de ACREDITAR e AGIRMOS, para que isso aconteça.
E atenção!! Não é sobre querermos ser iguais aos homens, é sobre sermos MULHERES, e nesta condição maravilhosa que nos assiste, exercermos com honra e com o merecido respeito o nosso lugar na sociedade.
Este meu relato sobre o que sentia nas minhas viagens foi só um mote para vos falar sobre uma das pressões que nós, mulheres, sentimos…
O facto de eu viajar com regularidade não coloca em risco, nem nunca colocou, a boa educação dos meus filhos, nem tão pouco lhes falta, ou faltou, amor por esse motivo.
Mas demorei a chegar a este nível de consciência.
Hoje, com 2 filhos, um com 17 e outro com 4, consigo viver a minha vida familiar de uma forma mais tranquila. Profissionalmente, continuo a viajar e a fazer o meu trabalho. Não vou dizer que da mesma forma, porque estaria a mentir. É bem melhor agora; sou uma mãe e uma profissional bem mais plena.
O primeiro passo desta jornada é deixarmos de dar atenção ao que os outros possam eventualmente pensar a nosso respeito (ouvindo-nos e sentindo-nos mais) e o segundo é não nos compararmos.
Como é que isto é possível?
É possível, sim, quando ganhamos a consciência do nosso verdadeiro valor nas diferentes posições que ocupamos nas nossas vidas, seja como mães, esposas, filhas ou profissionais…
AHH, e também quando paramos de nos criticar e falar mal umas das outras!
As mulheres que se apoiam constroem um legado que transcende gerações, garantindo um caminho mais justo e inclusivo para as próximas gerações.
A sororidade é um conceito que descreve a irmandade entre mulheres e vai muito além do apoio, da empatia e da cooperação entre nós. É também uma ferramenta política para a transformação da nossa sociedade.
Que nos unamos, que confiemos mais umas nas outras, porque este caminho não é individual, é coletivo!